Há tempo que não transito por esse território!
as mantive meu amor a ele! Tanto que o preservo!
Fiquei um tanto desconcertado:
– O que escrever, sendo que rompi certa cadência! – pensava.
Bom, vai um desses que escrevi no contexto de um projeto provisoriamente abandonado, em meio a umas pesquisas sobre algumas histórias de Colatina!
Aurora em Colatina!
COLATINA: MULHER!
Como Israel para Yaweh
Como a Igreja para Cristo
Como Meca para os muçulmanos
Como o Tajmahal para seu rei.
Assim tu, Colatina, para mim.
Que teu espírito, sei qual é:
Procriar, procriar, procriar.
Sou teu filho? Sim, sou eu!
O Édipo que retorna,
Não para matar teu esposo,
Mas para degolar teu Pai
Com seus julgos sobre ti.
Quantos conquistadores te cantaram,
Cantaram teu canto,
Teu pranto,
E só tiveram febres!?
Poeira que o vento leva,
E só fica na história.
Abundou quem te tomasse à força,
Também quem naufragasse
Nos rios que se formam do teu pranto
E correm para teu seio opulento.
Abundou quem bestificasse
No fogo do teu semblante,
Na aurora e no crepúsculo,
E morresse no paradoxo
De tua viril virgindade.
A tu, que tantos filhos tens,
Nascidos pela cabeça,
Que te falta agora, Dona Colatina?
A tu, cuja cria ganha
Silenciosamente
O mundo,
Enquanto ainda há índios
Que se deliciam com os cães,
Que tormentos afligem?
Que desejos ainda
Regurgitam em tuas vísceras?
Que sussurros ressoam
Ao pé de teus ouvidos?
O que me suplica –
No calor de meu sono,
No furor das torrentes de meu sangue,
No sopro que saxofoneia
Em minha garganta,
Na tensão dos mil tentáculos
Que tenho para agarrar
O travesseiro –
Esse teu sedutor declamar?
Bem te sei,
Fruta madura,
Que ainda não provou
Da melhor sugada,
Do melhor sugão?
Não houve quem trouxe graça
Aos teus olhos.
Não houve quem
De uma vez por todas,
Te fizesse mulher…
Mulher… Mulher…
Para aquém e além
Da função do parimento.
Não houve quem te seduzisse.
Só quem demarcasse teu corpo.
Não houve quem fincasse
Em tua alma,
A glória do entregar-se.
Tivestes as vestes rasgadas.
Só isso!
Te desnudaram na marra,
Gloriaram-se de te penetrarem
Estando distantes de ti.
Não tiveste homem algum
Ao teu seio, ao teu cólo, ao teu lado.
Tivestes desbravadores!
Amansadores de uma cólera
Que nunca houve em ti.
Houve quem passasse por ti.
Houve quem te deixasse sozinha
No sereno do ar que invade teus aposentos,
Noites a fio.
E agora murmuras ao meu ouvido…
Um canto baixinho,
Tanto pulsa como mantra,
Que a cada compasso
Mais me ouriça, me invade,
Turbilhona meus sentidos,
Eletriza minha pele,
Num roçar louco
De uma presença
Cada dia mais insidiosa
E perturbadora.
Deixe-me dormir,
Égua no cio!
Há nos meus sonhos,
Mais mergulho em tuas fontes
Que jamais pudesse mesmo
Infinitar em tuas vagas
Mais maremóticas de pensamento.
Há nas minhas profundezas,
Mais satisfação e regozijo
Que mil haréns de Sherazades
Pudessem juntos,
No desfiladeiro dos séculos,
Maquinar,
No teu gozo em ludibriar a morte!
Bem sei que queres o frenesi
De minha juventude,
O arrogar de meu grito nas multidões,
A serenidade silenciosa
De minha mais sublime solidão.
A solidão que engendra-me mil almas
Jamais sonhadas ou vividas.
A solidão para a qual
Nenhuma montanha se erigiu na Terra
Que dignasse seu trânsito de louvor e glória.
Essa solidão contra a qual
Mil infernos não resistem.
Essa solidão que se faz três
Para se suportar,
Em seu ardoroso desígnio de criar…
Criar… criar…
Até a exaustão
E redobrar perpétuo
Ao seu intento.
É a partir dessa solidão
Que anseias que te possua.
Bem sei tua malícia,
Sedutora de aristocratas!
Queres do melhor
De minha majestade,
Que é o que falta, aos teus olhos,
Aos lambões do teu caminho.
Queres mais um
Para o rol dos teus súditos!
Feiticeira! Não vou eu, também,
Embrenhar-me na vastidão
De teus territórios,
Para que me infernizes
Num futuro
Em que tu te mostrarás,
Enfim, deserto e secura sertaneja.
Sobre mim, me basta a culpa de Cristo!
Meus ossos
Não serão refúgio, nem morada
Para os escorpiões
De teu deserto que se agiganta.
Colatina, mulher madura!
Para ti, só mesmo eu,
Com minha maliciosa
E também sedutora…
Gargalhada!
Vitória, 18 de Abril de 2004 – 01:40 hs.